Vila Calama
Ao Laio, Binho e outros curumins
In memoriam: Beth
Naquele tempo na remota vila de Calama
o tempo era medido pelo coração selvagem
e pelo luar bem perto dos olhos
não havia ainda lido os poemas do Gullar
não havia visto o azul do mar do Ceará
não havia tomado minha primeira coca-cola
a vida tinha os olhos das papoulas vermelhas
a visão encarnada de verde eram gritos das araras
o coração era um crepúsculo manchado de barrancos
o sangue era amarelo do rio que corria nas minhas veias
florindo as margens de campos de tangerinas
guaranás de olhos encantados
seringueiras de tetas repletas de volúpias e leites
jatuaranas de escamas de sol e desejos
havia missas e castiçais e novenas
arrais profanos e quadrilhas e boi bumbais
o boto tucuxi espreitava as meninas
a uiara encantava os meninos
pião roxo curava as feridas
batelão levava e trazia os sonhos do radio
a zagaia domava o coração bravio
o remo domesticava a proa da canoa
tatuava os músculo do caboclo de artérias fortes
alimentava a cuia de açaí e abacaba e patuá
abria as vértebras do roçado de farinha d¿água
tremia de sabias as folhas da palmeiras
as pupunhas era uma tela cromática em cachos
igarapés refletiam minha alma de narciso
molhava meu corpo de Dionísio
gelava meus sonhos de caapi e caiçuma
trazia-me de volta para o reino telúrico
tacacá aquecia minhas entranhas
adormecendo meus lábios com goles quentes
a vida não tinha calendários nem eras
era regida pelo impulso das estações
mas o barco que me levou não voltou
conheci os vagões da madeira-mamoré
li um poema do Drumond
a metafísica de Aristóteles
tomei uma coca-cola e escutei uma ópera
olhei teus seios escondidos na via-láctea
teu sorriso na propaganda da televisão
masquei um chiclete repleto de mais-valia
comi um chocolate marcado pelo suor
andei por uma avenida sem fim
atravessei agitados cruzamentos
mastiguei meu primeiro filme com pipocas
gelei meu coração com sorvete de máquina
procurei as estrelas que sumiram do céu
tive minha primeira insÿnia no hotel
engoli minha enxaqueca com pílulas brancas
meus dias eram dos calendários
minhas horas e minutos eram tic-tac dos relógios
a guerra dos sete dias nas revistas
o gibi colorido de confeitos e lápis de cor
a maria-fumaça era pura realidade de metal
ia para outra cidade atravessando pontes de aços
o mercado central incendiou a cidade
Vespasiano Ramos era cousa alguma a cada passo
declamado pelo Cabo Lira na esquina no bar na praça
lírico embriagado de sonetos de luar
a poesia do Binho o Café Santos o Bar do Arara
Jota Limat o cine Brasil o cine Guarani mas ali
o cavaquinho telegrafado pelos acordes do Ivo
mandou mensagem ao meu coração agitado
minha alma se perdeu na imensidão do Cai n¿água
no drama do teatro amazonas
o Madeira levou minhas mágoas
o rio Negro enxugou minhas lágrimas
o Mamoré mergulhou minha paixão
nunca mais encontrei meu primeiro amor
nunca mas me encontrei
nem respondi as perguntas
que foram sendo formuladas pela minha razão
e passei a vagar pelo ocidente.
Luiz Alfredo
Maninho, estou deverasmente emocionada. Tronxinha de saudade de te ver.
ResponderExcluirLembrei uns versos do cabo Binho - "o reino rio é feliz por não ter nenhum Delfim", infelizmente o reino rio agora tem Dilma, que não deixa os botos subirem e nem descerem suas àguas. A ladeira do João Barril perdeu a inclinação e o canto da Iara foi encoberto pelos roncos ensurdecedores das máquinas que barram o madeira.
PARA DIACUI E SURUI
ResponderExcluirPAC
(IN) PAC (TO)
PACOTE
(EM) PACOTADO
PAC (TUADO)
APROVADO
PAC TOU BUM BOOL
CACHOEIRA DE SANTO ANTÔNIO
MORRE PACA
BICHOS PACAS
MORRE CUTIA
MORRE ANTA
MORRE GENTE DE SAUDADES
MORRE NAMBU
MORRE JACU
MATA MATA-MATA
GARÇAS VÃO EMBORA
JABURU JACAMIM CAIPORA
CAÍ FORA
IARA NÃO VAI ENCANTAR
MEU DEUS IAGORA
JACI NÃO VAI ILUMINAR
ALUMINAR AS PEDRAS NEGRAS
NÃO É O CILIBRIM DA MARIA FUMAÇA
É LUZ É VOLT VOTE A ILUMINAR
A FLORESTA VERDE VAI MORRER
UIRAPURU NÃO VAI CANTAR
AS GAIVOTAS TALVEZ FIQUEM
TERÁM PEIXES AINDA PRA PESCAR
VAI EMBORA O PESCADOR
TUDO VAI ALAGAR
NÃO TEM MAIS CURIMATÃ
LEVA SUA TARAFA E SUA CANÇÃO
SUA LINHADA COMPANHEIRA DAS MADRUGADAS
ENLUARADA DE SONHOS SURUBINS PINTADOS MANDIS
CASINHAS SUSPENSAS NAS PEDRAS
SERÃO PINTURAS PREGADAS NAS PAREDES
LEVA SEUS SONHOS EM SUAS REDES
CACHOEIRAS VÃO CESSAR
DESVIADAS VÃO ACENDER FILAMENTOS
REATORES VÃO GIRAR
AGORA TRATORES TIRAM PEDRAS
CERCAM AS ÁGUAS BARRENTAS COM CIMENTOS
SEM SENTIMENTOS EXPLODEM O QUE FICAR
ATERRAM MONUMENTOS ARQUEOLÓGICOS
LEVAM OS MACACOS PRO ZOOLÓGICO
RESGATAM O QUE BOIAR
JIBÓIA GATO MARACAJÁ TRACAJÁ
MAS MORREM AS LEMBRANÇAS
PEIXE-BOI PEIXE-MULHER MARAPARÁ
QUE NÃO SE PODE FOTOGRAFAR
PREGUIÇAS TATUS JABUTIS TERAM QUE NADAR
MORREM AS ALDEIAS DOS INDIOS JÁ EXTINTAS
SUAS FLECHAS SUAS FLAUTAS SUAS TINTAS
MORRE CACHOEIRA DE SAMUEL
PIRACEMA SIRIEMA TANTOS POEMAS
MORREM OS CIMITÉRIOS JÁ MORTOS
AS RUAS AS CASAS JÁ APAGADAS DA HISTÓRIA
O MERCADO OS ESCRITÓRIOS A ESTAÇÃO DO TREM
DESATIVADOS DESTRUIDOS DESDE DE OUTRORA
MAS FICAM OS POEMAS DO MADO
A CANÇÃO DO BINHO E DO BADO
A CRÔNICA DO AMARAL FERINA FATAL
PARA TOCAR NA FERIDA ABERTA QUE FICAR
NAS CICATRIZES PERDIDAS EM CARNE VIVA
DORMENTES ADORMECIDOS HÁ MUITO TEMPO
MORTALHAS DESGASTADAS PELO VENTO
TRILHOS LITORINAS AFOGADAS NO RIO
PIO DA RASGA-MORTALHA GRALHAS DRAGAS
ANUM COM GRAVETO NO BICO DE AÇO
NOS GALHOS DA PÓS-MODERNIDADE
OLHANDO A CIDADE ILUMINADA AINDA PELO LUAR
ACARICIADA PELO MORMAÇO EQUATORIAL
PELA FORÇA DAS ÁGUAS DO MADEIRA
PELA CACHOEIRA NAUFRAGADA
TRAGADA EXPRODIDA DESCONSTRUIDA
PARA ACENDER AS LÂMPDADAS DE LÁ
DOS CORREDORES DAS ORGANIZAÇÕES
MÁQUINAS DE PRODUÇÃO E PODER
QUE COMPRAM MÚSCULOS HUMANOS
E VENDEM SONHOS EMBALADOS EM CELOFONES
PELOS CARTÕES DE CRÉDITOS E TELEFONES
E ESPANTAM POESIAS COM SEUS CÁLCULOS
E ESPANTALHOS COM CORVOS EMBALSAMADOS
VENDERÃO ENERGIA A PREÇO DE OURO DE EURO
ENERGIA TIRADA DO RIO MADEIRA
OURO SUGADO DO RIO MADEIRA
A PREÇO DE BANANA BRAZIL.
LUIZ ALFREDO - POETA